quinta-feira, 26 de abril de 2012


Não que falar da Big Apple seja difícil: eu teria várias histórias interessantes pra contar a respeito dessas (dezoito?) vezes em que tive a oportunidade de estar lá - e acreditem, não importa a quantidade de oportunidades, cada qual é sempre única. 

Mas Woody Allen falou. Spike Lee falou. Lou Reed falou. Paul Auster falou. Gay Talese, meu herói, falou - disse que NYC é uma cidade de "things unnoticed", porém não deixei de notar o preço da Coca Zero. De toda forma, depois do glamour dessa lista, quem sou eu, pobre escritora de gaveta, pra dizer algo?

Direi apenas que Nova York é, para mim, algo como um universo paralelo. Andar naquelas ruas congruentes é ter a impressão (incongruente) de viver dentro de um seriado. Ou de Poderosa Afrodite. As pessoas falam como nos filmes. Alguns realmente se vestem como em Sex and the City, por pior que isso possa ser, enquanto a maioria perambula pelo metrô com suas roupas de todo dia (e é destes que eu gosto, em NYC se ANDA, ou seja, pior pra você se sair por aí cheia de penduricalhos). E a ficha da gente só cai quando alguém esbarra na gente e gentilmente nos manda "watch it", ou na primeira vez em que a catraca do metrô dá piti e não aceita nosso Metrocard. Sim, o filme é de verdade.

Os novaiorquinos são paulistanos ao quadrado. Cada qual em sua bolha, bonitinhos, como aqui. Eles trabalham from 9 to 5 (claro que, muitas vezes, além disso - já foi contabilizado que, lá, já há mais gente trabalhando à noite do que de dia) e depois tomam whisky sour e falam sobre suas famílias com estranhos(as) que sentam-se ao lado no bar, e que jamais voltarão a encontrar, a não ser por uma incrível coincidência randômica escrita no destino. Já vi isso acontecer algumas vezes no pub, no bar do hotel, no restaurante turístico. 

E as sirenes das ambulâncias, e carros de bombeiro, e polícia, também são as nossas... ao cubo. Lugar mais barulhento tá pra surgir. Daí então eles fogem pro meio do Central Park pra comer um bagel (aquele donut de massa de pão que eles adoram, pobres incautos que nunca viram pãozinho francês). Mas não largam o telefone celular, que sempre tem câmera, late, apita e faz ronron. Outro sinal dos tempos.

Nosso senso de humor negro eles também não têm, embora exerçam com maestria a arte do sarcasmo. Jamais fariam piada com o 11 de setembro, por exemplo, como fizemos com o buracão do metrô. São ufanistas como quase todos os americano, mas às avessas: falam mal do ex presidente Bush, mas tenta ir você, brasileirinho, dizer um "a"... é igual àquela história do irmão mais novo, "eu posso xingar mas os outros não"...

Coisa que eles sabem bem é preservar a própria história. Vide a conservação da Grand Central Station (alguém me leva no Oyster Bar?) e o incrível Cloisters, praticamente um edifício medieval que foi transportado pro norte da ilha. No norte da ilha, aliás, só tem mato, sabiam? Eu também só fui saber depois que fiz o cruzeirinho ao redor de Manhattan, ano passado. Foi também a primeira vez em que vi o famosérrimo Yankee Stadium de perto, e passei embaixo da lindaça Brooklyn Bridge.

Sinto saudades de quando a tia Sandra morava lá e era legal o suficiente pra me deixar passar dias e dias no apartamento dela na rua 46 com 9ª avenida. Tenho lembranças pra lá de pitorescas de ir com a tia Lilian num tal de Big Apple Meat Market (nome suuuper original, aliás), que carinhosamente chamávamos de "supermercado dos pobres", onde a gente tinha que entrar na câmara frigorífica pra pegar os produtos de geladeira. E enquanto isso, tia Sandra ia e voltava do trabalho à pé. Inveja é pouco.

Glamour? Acho que não. Os novaiorquinos ali estão, vivendo suas vidas numa cidade grande que é como qualquer outra cidade grande. Talvez nós é que sejamos acostumados desde sempre a pensar nessa cidade como diferente de todas as outras. Ou talvez não. É bonita mesmo suja, é um pouco cruel mesmo acolhedora, "nunca dorme" mas os restaurantes de turista fecham cedo.  E eu quero levar a Nina lá quando ela já tiver idade suficiente pra se divertir no zoo do Central Park e em Coney Island. Acho que antes não volto: fico aqui lembrando e escrevendo.

(foto de agosto/2006, de minha autoria, mostrando a águia da Grand Central e o fabuloso Chrysler Building, o prédio mais bonito da cidade. O texto é de 2007, e fiz algumas pequenas alterações antes de republicar. Em 2011 estive lá pra comprar o enxoval da Nina e escrevi um texto bem mais crítico no VnF?. Fiquei pensando no que poderia ter acontecido: eu mudei? minha visão mudou? eu me contradisse? Porém, pensando bem, achei que no final a diferença foi só na abordagem mesmo.).